Lado M

Who the fuck are Arctic Monkeys?

Foi frenético. Na madrugada do dia 23 de julho, quem tentou comprar ingressos para os shows do Arctic Monkeys, que acontecem em novembro no Brasil vivenciou o que poderia ser chamado de uma verdadeira batalha. Em minutos, foram-se os ingressos de meia entrada. Horas depois, só sobravam ingressos para quem quisesse pagar inteira – e ainda ver o show de longe. Mas por que esse frenesi todo, digno de show de ex-Beatle? Porque o Arctic Monkeys é o fenômeno indie de maior representação da atualidade – e com louvor!

Tudo começou no Natal de 2001, quando Alex Turner – vocalista do grupo – e seu colega Jamie Cook ganharam guitarras de presente. Dois anos depois, os dois montaram uma banda de covers com os colegas da Stocksbridge High School, onde estudavam. Eram eles Matt Helders, o baterista, e Andy Nicholson, o baixista. Nascia então o embrião daquilo que se tornaria o Arctic Monkeys. Começaram fazendo shows em sua cidade natal, Sheffield, na Inglaterra, e logo deram o próximo passo: a gravação independente de uma série de CDs-demos com músicas próprias, os quais distribuíam em seus shows. Foi essa a grande sacada dos ingleses: distribuídas as demos, foi necessário apenas um pulo para que as músicas caíssem na internet e começassem a rodar o mundo, graças aos fãs e ao compartilhamento de arquivos.

Chamando cada vez mais atenção entre veículos de imprensa importantes, como a BBC Radio, e principalmente no meio musical, com seu rock explosivo, a banda lançou em maio de 2005 o seu primeiro EP, Five Minutes With Arctic Monkeys. Toda a especulação em torno do quarteto inglês, que vinha cada vez mais surpreendendo, acabou lhes rendendo um contrato com a gravadora Domino Records, já no mês seguinte. O sucesso verdadeiro da banda, porém, só foi comprovado com o lançamento da dançante I Bet You Look Good On The Dancefloor, o primeiro single oficial, que subiu direto para o topo das paradas musicais.Dois meses depois,era a hora do grande debut: o primeiro álbum, Whatever People Say I Am, That’s What I’m Not, era enfim lançado. Foi estrondoso. O CD desbancou Definitely Maybe, do Oasis, se tornando o álbum de estréia vendido mais rapidamente na história da música britânica. Foram 120.000 cópias vendidas apenas no dia de seu lançamento, sem contar aquelas que acabaram sendo compartilhadas pela internet. Não é pra menos que o CD arrebatou ainda o Mercury Music Prize do ano (prêmio para o melhor álbum lançado no Reino Unido ou na Irlanda).


O pontapé inicial: o primeiro single, o primeiro sucesso

Ainda em 2006, o quarteto passou por uma transição. Durante uma turnê, o baixista Nick O’Malley substituiria Andy Nicholson apenas temporariamente. No entanto, em junho, Nicholson anunciou sua saída permanente, o que garantiu a O’Malley o posto de baixista oficial, o qual ocupa até hoje. A mudança, no entanto, não afetou o trabalho da banda. Após o lançamento do EP Who The Fuck Are Arctic Monkeys?, veio o segundo CD do grupo. Em abril de 2007, foi lançado o elétrico Favourite Worst Nightmare, rapidamente gravado, já que a banda queria voltar aos shows o mais depressa possível. A pressa, no entanto, não impactou na qualidade do álbum, de modo que a expectativa dos fãs não foi decepcionada. O disco vendeu 225.000 cópias na semana de seu lançamento, além de garantir uma série de prêmios.

Foi em 2007 que o Arctic Monkeys fez a sua primeira apresentação no Brasil. Um Alex Turner um tanto tímido subiu aos palcos do Tim Festival 2007, que passou por São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba. A banda lançou mão de um set list recheado com as melhores músicas de seus dois primeiros álbuns. Brianstorm, Fluorescent  Adolescent, Fake Tales Of San Francisco, I Bet You Look Good On The Dancefloor e When The Sun Goes Down levaram a platéia à loucura, que cantava até as linhas instrumentais das músicas.


Brianstorm reflete o espírito dos dois primeiros álbuns do AM: juvenil e completamente eletrizante

Neste mesmo ano, antes de lançarem o terceiro álbum, Alex Turner se voltou para outro projeto: a dupla The Last Shadow Puppets, junto com Miles Kane, da banda The Rascals. Outro porém também acabou adiando o lançamento de um novo cd. Durante o período de desenvolvimento do terceiro disco, que contou com a produção de Josh Homme, vocalista do Queens Of Stone Age, e de James Ford, Alex teve o seu caderninho de composições roubados. Mas o que poderia ter sido um grande empecilho, acabou se tornando uma nova oportunidade. ‘’Eu me sentei por horas tentando lembrar todas as letras, mas o processo acabou me fazendo escrever mais coisas, que eu não teria feito se nada tivesse acontecido’’, contou Alex para o portal NME.com. Humbug, o terceiro trabalho da banda, foi enfim lançado em agosto de 2009. O álbum recebeu boas críticas: com nítida influência do trabalho de Homme, se mostrou mais maduro e elegante. Menos explosivo e ao mesmo tempo mais pesado. Os garotos do Arctic Monkeys tinham crescido.

As novas direções tomadas pela banda agradaram bastante, mas os números de vendas não se mostraram tão expressivos, além de nenhuma das músicas do álbum ter entrado nos top 10 do Reino Unido. A resposta foi mais ou menos a mesma em relação ao quarto álbum da banda, Suck It And See, lançado em 2011. As músicas revelavam mais uma vez a maturidade dos ingleses, ainda que tivessem nitidamente um quê de pop-rock. Canções mais calmas como Piledriver Waltz e a faixa que dá nome ao álbum aparecem misturadas com composições de peso como Brick By Brick – cantada pelo baterista Matt Helders – e All My Own Stunts. O equilíbrio do álbum, unido às letras de qualidade fizeram com que sua receptividade fosse muito boa, ainda que os números não dissessem o mesmo.


Cornerstone, a balada romântica de Humbug, mostra que a banda estava pronta para experimentar e crescer

Se Humbug e Suck It and See desanimaram alguns fãs, a euforia voltou com tudo com o lançamento da enérgica R U Mine?, música que antecipava a chegada de um novo disco. Foi neste cenário que a banda desembarcou mais uma vez em terras brasileiras, desta vez para a primeira edição do festival Lollapalooza no país, que ocorreu no Jockey Club de São Paulo, em abril. Debaixo de uma chuvinha chata, confiantes e mais carismáticos do que em 2007, os ingleses fizeram um público de cerca de 60 mil pessoas cantar as letras rápidas e complicadas, apresentando músicas de todos os álbuns. Além disso, se mostraram mais adultos, tanto na postura como no visual, refletindo o amadurecimento de seus álbuns. O vocalista Alex Turner é a prova viva dessa mudança: seu figurino, cuja peça principal é hoje a jaqueta de couro, reflete uma postura bad-boy, combinada com o estiloso topete carregado de gel, bem diferente daquela adotada nos primórdios da banda.

Pode-se dizer que 2012 foi um bom ano para o Arctic Monkeys. Em julho, a banda se apresentou na majestosa cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de 2012, em Londres. As músicas escolhidas foram o hit que deu início ao sucesso do grupo, I Bet You Look Good On The Dance Floor e nada mais, nada menos, do que um cover de Come Together dos Beatles. O cover teve uma repercussão tão boa que alavancou as vendas de discos do Arctic Monkeys, levando seu primeiro trabalho a atingir o topo das paradas britânicas, seis anos após seu lançamento.

Mas será que isso tudo é suficiente pra explicar o sucesso estrondoso que a banda vem fazendo atualmente? Não, tem mais! Em setembro de 2013, a banda lançou seu mais recente álbum, o minimalista AM. Minimalista só no título, porque suas músicas vieram para tocar MUITO. AM segue a linha dos dois discos anteriores, mas possui faixas mais acessíveis e menos experimentais, o que torna a sua disseminação pelo mundo muito mais simples, vide a quantidade de festas e baladas que tocam incansavelmente Do I Wanna Know? e Why’d You Only Call Me When You’re High?. AM veio não apenas para tornar a representatividade da banda mais intensa, como também muito mais ampla – o que explica o desespero dos fãs na hora de garantir ingressos para os shows do quarteto.


Sucesso absoluto, Do I Wanna Know? mostra porque o Arctic Monkeys vem abalando o cenário musical

Entre altos e baixos, uma das características invejáveis da banda é a qualidade das composições. Por vezes ácidas, por vezes mais suaves, chamam a atenção e são um show à parte, mesmo quando a melodia decepciona. Uma das principais influências de Alex são os poemas de John Cooper Clarke. Foi graças à ele que Alex optou por falar em suas letras sobre situações cotidianas, através de descrições detalhadíssimas, o que é visível nas letras nada fáceis de acompanhar. Além disso, o poema Out of Control Fairground foi impresso dentro do cd-single de Fluorescent Adolescent, tendo sido escrito especialmente para seu lançamento. O clipe da música, foi inclusive, baseado nesse poema. Em AM, essa relação é mais uma vez presente: a excêntrica letra de I Wanna Be Yours é mais uma obra do poeta.

Como nem tudo são flores, a banda foi recentemente associada à um escândalo de sonegação de impostos, que envolveria cerca de 1.600 cidadãos britânicos, entre eles os quatro integrantes e até o cantor George Michael. Segundo informações do jornal The Times, a quantia sonegada pelo quarteto poderia chegar ao semelhante a 4 milhões de reais. O caso não abalou os fãs. Fiéis, estavam à postos na hora de comprar os ingressos para os shows que acontecem no dia 14 de novembro, na Arena Anhembi, em São Paulo e no dia 15, no HSBC Arena, no Rio de Janeiro. A julgar pela velocidade em que os ingressos foram vendidos, espera-se shows verdadeiramente inesquecíveis. Agora, porém, só nos resta esperar! E ah, corre que ainda tem ingresso!

Originalmente em: http://www.lado-m.com/fuck-arctic-monkeys/

Gisele

(Foto: Ângelo Pastorello)

Domingo passado, dia 20 de Julho, Gisele Bündchen assoprou velinhas. Junto de sua irmã gêmea, Patrícia, a modelo completou 34 anos equilibrando com maestria um combo de brasilidade, beleza e sobretudo, simpatia. Nós a vemos nas capas das revistas, nas propagandas de televisão, nas notícias, na final da Copa do Mundo apresentando a taça dos campeões. Diante de tudo isso, podemos entender, pelo menos um pouco, por que esta mulher conquistou o mundo.

Gisele, modelo

Um dos maiores ícones das passarelas, Gisele, hoje com vinte anos de carreira, começou cedo sua trajetória como modelo. Com apenas 14 anos, foi descoberta por um olheiro em São Paulo. Seu sonho de adolescência, porém, inicialmente não era ser modelo, sair desfilando por aí, para cima e para baixo. Alta e poderosa, ela queria ser jogadora de volêi. No entanto, diante da oportunidade, por que não aproveitá-la, certo? Foi o que pensou Gisele. Se matriculou em um curso de modelos em Horizontina, cidade onde nasceu, no Rio Grande do Sul. Queria melhorar sua postura, seu andar. Ao final do curso, em uma excursão a São Paulo, foi convidada por uma agência para fazer um book. E a partir de então, assumiu de vez o desafio. Após um concurso de beleza no qual ficou classificada entre as dez finalistas, mudou-se de vez para a cidade onde tudo havia começado. De São Paulo, investiu em sua carreira, e dois anos depois, subiu em um avião com destino a Nova Iorque e ao início de seu estrondoso sucesso internacional.

Ainda que muitas pessoas considerem Gisele magra demais, sua entrada no hall das supermodelos foi um verdadeiro marco. Em 1999, a revista Vogue afirmou que graças a ela, uma tendência dos padrões de beleza da época submergiu das profundezas: era a volta da modelo sexy, com mais corpo e curvas. Dava-se o adeus à onda até então em vigor, de modelos magérrimas e de aspecto pouco saudável, como era considerada, inclusive, a top Kate Moss.

Inegavelmente bela e cativante, Gisele se tornou um dos símbolos mais representativos das passarelas e consequentemente da moda. As roupas nada seriam sem pessoas que as vestissem e as top models, que desfilam as criações sob inúmeros flashes e olhos excitados, são as responsáveis por darem o pontapé inicial: elas são os rostos que dão vida à arte. Formam uma dupla com os estilistas, se tornam tão importantes quanto eles, devendo, portanto, serem lembradas com o mesmo renome.

Gisele é uma modelo cuja representação não podemos questionar. Já estampou mais de 500 capas de revistas, entre publicações nacionais e internacionais, além de desfilar para as mais famosas e importantes grifes do mundo fashion. Se tornou uma das principais Angels da marca de lingeries Victoria’s Secrets e fez centenas de propagandas para maisons como Givenchy, Valentino, Bulgari, Dior, Chanel (sim, ela é o novo rosto do perfume Chanel nº5), Ralph Lauren, Dolce&Gabanna, Emilio Pucci, Versace, Yves Saint Laurent, Louis Vuitton, Balenciaga (recentemente, até chegou a aparecer de cabelos curtíssimos em um dos anúncios!), Hope, Colcci, etc. Sempre disputadíssima, não dá para negar que ela já conquistou seu lugar ao sol.

Com uma carreira consolidada, é participando destas campanhas publicitárias que Gisele pode mostrar além de sua beleza, a sua versatilidade. Neste ano, como garota propraganda da rede de fast fashion sueca H&M, se arriscou cantando. Sim, a moça soltou a voz na versão produzida por Bob Sinclair de Heart Of Glass, do Blondie. O hit, disponível para compra no iTunes, tem os lucros revertidos para projetos educacionais da UNICEF. E não para por aí. Se você já assitiu a O Diabo Veste Prada (2006), com certeza reparou na carinha de Gisele em algumas das cenas. No longa, baseado no bestseller de Lauren Weisberger, a modelo só fez uma pequena ponta, mas esta não foi sua estréia na sétima arte. Em 2004, Gisele já havia interpretado a vilã Vanessa no remake de Táxi, contracenando com Queen Latifah e Jimmy Fallon. O filme não foi um grande sucesso, mas colaborou para enriquecer ainda mais um currículo já bastante farto.

Gisele, pessoa

Gisele Bündchen pode ser bonita, rica e famosa, mas como todos nós, é um ser humano qualquer. Acorda, trabalha, fica cansada. Já namorou e já se separou (lembram do affair com, nada mais, nada menos do que Leonardo DiCaprio?). Desde fevereiro de 2009, porém, é casada com o jogador de futebol americano Tom Brady. Ao contrário das tendências mais recentes no que dizem respeito à quantidade de filhos por casal nos últimos anos, Gisele e Tom constituiram uma grande família. O jogador trouxe John, filho de um relacionamento com a também modelo Bridget Moynahan. No mesmo ano do casamento, no entanto, o casal anunciou a primeira gravidez de Gisele, Benjamin. Em 2012, veio o segundo bebê, a menina Vivian Lake.

Um homem, uma mulher, três crianças e um relacionamento de amor. É pelo menos isso que Gisele deixa transparecer através de suas fotos no Instagram, adoradas pelo público e que acabam aproximando um ser, até então, distante. Ela é muito elogiada por conciliar trabalho e maternidade de um modo bastante consciente. Uma de suas fotos causou ao mesmo tempo polêmica e muito reconhecimento: a modelo, sentada, enquanto era maquiada e tinha seus cabelos arrumados, amamentava sua caçula. Que a vida não é assim para todas as mulheres, já sabemos. Mas não é porque ela dispõe de recursos que nem todos tem a seu alcance, que ela deixa de ser mulher, ou mesmo, de ser mãe. É isso que acaba causando a admiração e a simpatia que as pessoas tem em relação a ela. Gisele também é uma pessoa.

Além disso, adepta de um estilo de vida saudável – tanto na alimentação, como no dia-a-dia em sua casa – Gisele alia sua fama à questões importantes, sempre ligadas à saúde e ao meio ambiente. Em abril, iniciou sua participação no projeto Message In a Bottle, em apoio ao Dia Mundial do Meio Ambiente (05/06), chamando a atenção para o desperdício de comida. A modelo também defende causas como o combate à Aids, em especial na África, e a preservação da Floresta Amazônica, doando uma porcentagem dos lucros da venda de sua linha de sandálias. Ela já até chegou a doar todo o seu salário de uma semana de São Paulo Fashion Week para o programa Fome Zero, do governo Lula, além de se relacionar com inúmeros outros projetos envolvendo reciclagem, economia de energia, etc. Pode-se entender porque, além de ter carisma e visibilidade, Gisele foi escolhida, em 2009, como Embaixadora da Boa Vontade do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).

Gisele, mulher

Mulher independente, foi eleita pela Forbes pelo sétimo ano consecutivo como a modelo mais bem paga do mundo, ganhando por dia cerca de R$ 282 mil. E ainda assim, Gisele, não se demonstra esnobe, mas comum. Na semana passada, comemorou a chegada das férias com uma foto dando uma estrela na praia. Em outras, mostra o castelo de areia feito com os filhos, o café da manhã, a família torcendo pelo Brasil na Copa. Momentos que nós postaríamos nos nossos próprios Facebooks.

Mesmo que Gisele, descendente de alemães, não tenha uma beleza que a maioria das pessoas considerariam “tipicamente” tropical, ela abraça sua nacionalidade e mostra com sua simpatia, que é sim brasileira. Chamada de “übermodel”’ – que em alemão significa algo como a “maior modelo’” – ela é a queridinha do Brasil nas passarelas. Na vida: parabéns Gisele!

Originalmente em: http://www.lado-m.com/gisele/

Ode à camiseta!

Não dá para negar: está tendo Copa sim e os brasileiros entraram de corpo e alma na torcida pela Seleção. Bandeirinhas por todos os lados, faixas verdes e amarelas penduradas nas sacadas dos prédios, cornetas soando a todo o momento. Além de tudo isso, porém, um dos reflexos mais intensos da Copa é notado, sem dúvidas, nas vitrines das lojas de roupas. Observe por aí: nos bairros, nos shoppings, todas as lojas se renderam. Calças, blusas, sapatos, bolsas, o que você quiser, nas cores do Brasil, para torcer vestido a caráter!

É verdade que, quando o assunto é “Moda Para a Copa”, há mil e uma possibilidades, mas a peça favorita dos torcedores é, sem sombra de dúvidas, a camiseta! Seja o modelo oficial, uma versão mais detalhada feita por aquela grife chiquetosa ou aquela azulzinha básica que tiramos do fundo da gaveta porque não temos nada do Brasil para vestir, nós sempre acabamos lançando mão da boa e velha camiseta.

Prática e esportiva, ela é realmente um curinga. Mas de onde veio essa maravilha dos deuses, que serve para todos os momentos? Apesar de só ter sido inventada, efetivamente, em 1913, a camiseta já tinha uma ancestral desde a Antiguidade. Era a camisia, uma espécie de túnica usada como roupa-de-baixo, para proteger da transpiração, do frio e do desgaste das próprias roupas na Roma Antiga. Porém, foi só no início do século 20, com algumas adaptações depois, que a camiseta nasceu como conhecemos. Ela era branca e foi criada para ser usada embaixo dos uniformes dos oficiais da Marinha americana. Adotada por soldados e operários, sua principal função ainda era a proteção, sem ter nada a ver com moda.

Confortável e versátil, poderíamos pensar que, em pouco tempo, a camiseta conquistou seu lugar nas ruas, certo? É, mas não foi bem assim. O processo durou cerca de quarenta anos e só foi possível graças à influência do cinema. Obrigada Marlon Brando! Obrigada James Dean! Foi o nosso querido Godfather que apareceu pela primeira vez vestindo a famosa camiseta nas telonas, em Um Bonde Chamado Desejo, de 1951. Quatro anos depois, foi a vez da icônica aparição de James Dean, em Juventude Transviada. Pronto, o circo estava armado: influenciados pelo contexto social, os jovens da década de 60, se inspiraram no cinema e adotaram a camiseta como símbolo de uma política de contestação dos valores da época e da sociedade.

Marlon Brando, em “Um Bonde Chamado Desejo”

A camiseta caía, enfim, nas graças da população. Os jovens a utilizavam como meio de expressão. Os movimentos anti-guerra e a favor da liberdade, que tinham os hippies como protagonistas, usavam a peça para trazer mensagens de paz e amor. Políticos aproveitavam, e a utilizavam como instrumento de propaganda para suas campanhas de eleição. O mercado e a indústria viram nela a possibilidade de fazer publicidade de um jeito diferente, além de transformá-la na maior bandeira de suas etiquetas. A camiseta não só atingiu o sucesso como passou a integrar todos os guarda-roupas de todo o mundo.

E mais de cem anos depois, aqui estamos nós, diante da mais democrática peça de roupa de todos os tempos. Usada por homens e mulheres, adultos e crianças, ricos e pobres. Podemos louvá-la por sua versatilidade e não há marca que a deixe de fabricar. Chique ou mais básica, pode ir a praticamente todos os lugares. Podemos amá-la por seu conforto, porque quem não ama dormir com aquela camiseta velha e surrada no lugar do pijama? E ainda agradecê-la pela união que promove. Não é uma delícia se deparar com alguém no metrô vestindo uma camiseta daquele filme que você ama mas ninguém mais conhece? Sim, sim, sim, sim para tudo.

Seja na Copa, no inverno ou no verão: querida camiseta, obrigada por existir!

Originalmente em: http://www.lado-m.com/ode-a-camiseta/

Deveríamos ser todos Maya!

Produzir, produzir, produzir! Consumir, consumir, consumir! Vestir, vestir, vestir! Vivemos num ritmo frenético: as indústrias produzem loucamente, nós consumimos no mesmo passo, e o ciclo é infinito. Mas não deveria ser assim. Esse estilo de vida não só acaba prejudicando a nós mesmos, mas, principalmente, ao meio ambiente.

A indústria da moda se encaixa muito bem nesse cenário, não dá para negar. E é pensando nisso que uma série de marcas e profissionais vem entrando na onda da moda sustentável e ecológica. A ideia aqui é continuar produzindo, mas de um jeito legal e que não prejudique a natureza. Os tecidos de fibras naturais são preferência e, além disso, você sabia que dá pra usar garrafas PETs recicladas na produção de roupas? Pois é.

Isso tudo parece muito importante e complicado, é verdade. Mas isso não significa que seja assunto de ‘’gente grande’’. Nananinanão! Quem prova isso para a gente é Maya Shea Penn! Quem? Mais conhecida como Maya Penn, é uma garota americana de apenas 14 anos e que se preocupa com moda sustentável como muita (muita!) gente deveria se preocupar!

Maya é o que podemos chamar de ‘’sucesso precoce’’. Com menos de quinze anos, ela é empresária, filantrópica, designer, ilustradora, escritora e ainda produz curtas animados. UOU, isso tudo é possível? Sim! Seu principal projeto é o Maya’s Ideas – site em que vende roupas e acessórios desenhados por ela mesma. ‘’Eu adorava usar diferentes tipos de faixas de cabelo e decidi que este seria um bom jeito de começar’’, disse Maya para a Forbes. Além disso, ela sempre foi apaixonada por duas coisas: tecnologia e ecologia. Como unir tudo isso? Simples. Em 2008 (com apenas 8 anos), Maya criou seu próprio site, e, ao invés de vender simplesmente acessórios bonitinhos, ela pensou em um jeito de produzi-los e, ao mesmo tempo, colaborar com o meio ambiente.

Todos os seus produtos são feitos à mão e produzidos com materiais que não prejudicam a natureza: algodão 100% orgânico, tecidos de fibras de cânhamo e bambu, materiais reciclados e antigos. Ela não usa, por exemplo, couro ou lã novos. Ela explica em seu site: ‘’Se eu me deparar com alguma peça vintage, dos anos 1940, feita de lã, eu posso transformá-la em uma nova criação, mas eu nunca compraria uma peça feita de lã nova, que foi cruelmente tosquiada de um carneiro’’. Suas criações são vendidas no mundo todo, e de cara com seu sucesso, Maya vai além. Entre 10% e 20% de seus lucros vão para organizações de caridade locais e globais, como Hosea Feed The Hungry, Atlanta Community Food Bank e The Captain Planet Found. Ela ainda criou a Maya’s Ideas 4 The Planet, a sua própria organização sem fins lucrativos. Através dela, Maya tem o objetivo de espalhar a importância de se ter uma consciência ambiental e encorajar jovens a seguir seus sonhos em áreas não tradicionais, como ela própria fez.

Maya é jovem e, provavelmente, ainda tem muita coisa para aprender. Mas sua iniciativa, com certeza, é digna de destaque. Com apenas 8 anos, teve uma ideia que, na maioria das vezes, não teria nenhum apoio. Mas foi assim, sendo perseverante (uma das mais importantes lições que Maya aprendeu, como disse à Forbes), que a garota se tornou um verdadeiro exemplo de dedicação e preocupação com algo que todos nós deveríamos ter: a nossa casa, o nosso mundo.

Na moda, na atitude, no dia-a-dia, fica a dica: sejamos todos Maya Penn.

Originalmente em: http://www.lado-m.com/deveriamos-ser-todos-maya/

Yves Saint Laurent: um gênio imortal

Já faz quase seis anos que Yves Saint Laurent deu seu adeus, em 1 de junho de 2008. No entanto, seu nome continua vivo e parece não ter a intenção de abandonar seu posto, mais que merecido, no mundo da moda. Neste ano, o famoso costureiro tem sua vida retratada em duas cinebiografias, e, em São Paulo, é homenageado em uma peça teatral. Nas produções, é revelado um outro lado de Saint Laurent: impetuoso e emocional. Sua história, por vezes, se esconde por trás do sucesso, mas só conhecendo a sua trajetória é que podemos entender quem realmente foi Yves Saint Laurent e porque essas três palavras transformaram a moda.

Jovem sucesso

Ao contrário do que muitos acreditam, Yves Henri Donat Mathieu Saint Laurent não nasceu na França. Na verdade, nasceu no dia 1 de agosto de 1936 em Orã, na Argélia (que na época, porém, era possessão francesa). Seu pai, Charles, trabalhava em uma companhia de seguros e a família vivia bem. Foi da mãe, Lucienne, no entanto, que herdou o gosto pela moda. O pequeno Saint Laurent a acompanhava nas visitas às costureiras e adorava dar opiniões.

Desenhava vestidos para a mãe e para as irmãs, Michelle e Brigitte, desde jovem. Foi com apenas 17 anos que conquistou o terceiro prêmio no concurso de estilistas organizado pela Secretaria Geral da Lã, em 1953. No ano seguinte, arrebatou o primeiro lugar com um vestido de noite. Foi assim que, pouco a pouco, passou a chamar a atenção de profissionais do ramo, entre eles o editor-chefe da Vogue francesa, Michel de Brunhoff. Impressionado por suas criações, mostrou alguns desenhos para Christian Dior, que notando certa afinidade com suas produções, contratou-o para trabalhar em sua maison.

A partir de então, Saint Laurent passou a trabalhar como um dos desenhistas de Dior. Criava e ficava responsável pela confecção de certos modelos. Destacava-se e deixava seu talento mais que evidente. Foi a perfeição de seu trabalho que levou Dior a anunciar, em 1957, que Saint Laurent seria o seu sucessor quando morresse.

Dior apenas não sabia que isso aconteceria tão rápido. Em outubro de 1957, o estilista sofreu um ataque cardíado e, em março de 1958, Yves Saint Laurent assumiu a direção criativa da casa. É verdade que o jovem estilista não tinha uma maison própria, mas foi trabalhando na Dior que alcançou seu primeiro sucesso verdadeiro, com apenas 21 anos. Sua coleção de primavera/verão de 1958 – que inovou com modelos de linha trapézio – salvou a casa da ruína financeira.

Nada é tão simples

Como tudo o que é bom dura pouco, com a felicidade e o sucesso de Yves Saint Laurent dentro da Dior não seria diferente. Em sua terra natal, começava uma guerra por independência. O costureiro havia sido dispensado do serviço militar, mas membros da própria Dior que não gostavam do estilista e de seu trabalho na maison, conseguiram que a situação fosse revertida. Assim, em 1960, Saint Laurent foi convocado para compor o exército francês. A partir de então, o mundo do estilista desmoronou. Durante os vinte dias que permaneceu no exército, sofreu com as exaustivas provocações dos colegas. O estresse culminou em sua internação no hospital Val de Grâce, em função de uma depressão nervosa. A situação não melhorou quando, ainda internado, descobriu que foi afastado definitivamente da direção criativa da Dior e substituído por Marc Boham.

As perspectivas só começam a melhorar quando Yves Saint Laurent sai do hospital, em maio de 1961. Foi aí que, movido por um certo desejo de dar a volta por cima, ele e seu companheiro Pierre Bergé – o qual conheceu durante um jantar de comemoração por sua entrada na Dior – planejaram abrir um ateliê próprio. Mas, apesar da animação do público, faltava capital. Foi uma matéria na revista Paris Match, que anunciava a volta do estilista, que chamou a atenção de Jesse Mack Robinson, dono de uma companhia de seguros em Atlanta (EUA). Robinson investiu setecentos mil dólares e Saint Laurent e Bergé conseguiram abrir sua maison em Paris, no fim de 1961.

Yves e Pierre tinham uma relação um tanto conturbada. Saint Laurent era ambicioso e exigentíssimo consigo mesmo. Almejava o sucesso e chegava a ter crises quando uma coleção não era bem recebida. Além disso, tinha ataques de pânico e chegou até a se mutilar. Era tímido, não conseguia se relacionar bem com as pessoas, o que, por vezes, dificultava seu trabalho. De um outro lado, porém, havia Pierre. Mais falante e desenvolto, pode-se dizer que completava Yves, principalmente no que diz respeito à direção da marca fundada pelos dois. Enquanto Saint Laurent criava, Bergé administrava. O que não significava, porém, que era uma pessoa fácil: Bergé era possessivo e controlador, de modo que conflitos aqui e ali não eram raros. Apesar de tudo, os dois foram parceiros por mais de trinta anos, inclusive após se separarem afetivamente em 1976.

Saint Laurent e Bergé: parceria de uma vida

Inovador

Tem início o império Yves Saint Laurent. Império que deixaria sua marca na história da moda. Em 1965, realizou a homenagem ao pintor Piet Mondrian com um vestido shift (reto e sem mangas). Feito de lã, tinha a estampa inspirada nos quadros do artista, usando a mesma paleta de cores e formas semelhantes. Em setembro do mesmo ano, foi capa da Vogue francesa, o que colaborou para que se tornasse conhecido, e futuramente, um ícone da moda. Unindo praticidade a sofisticação, trouxe na coleção de outono/inverno de 1966, um de seus looks mais famosos: o smoking feminino. O conjunto, apelidado de Le Smoking, representava uma alternativa para a mulher daquela época, que vivenciava mudanças constantes e uma liberdade cada vez maior. Apareceu pela primeira vez em 1966 e depois em todas as outras coleções de Saint Laurent até 2002, em diferentes adaptações.

Foi o estilista que também popularizou certas tendências, como o estilo beatnik – marcado por calças justas, golas altas e botas compridas – e inspirações de fora da Europa, em especial na moda africana. Como viveu em Marrakesh, no Marrocos, pôde absorver muitas influências de lá. Suas coleções de primavera/verão de 1967 e 1968 é completamente inspirada por elementos étnicos: estampas de animais, túnicas, caftãs, vestidos feitos de ráfia e contas de madeira, e o clássico conjunto safári, eternizado por Saint Laurent. Foi ele também um dos primeiros estilistas a usar modelos negras na passarela.

Além de tudo isso, Saint Laurent foi um dos primeiros estilistas de alta-costura a se lançar no prêt-à-porter de luxo – produção em série das roupas que, até então, eram feitas todas à mão, sob medida, para cada uma de suas clientes. O costureiro não apenas se arriscou neste novo modo produção como o popularizou graças ao lançamento de sua boutique, a Rive Gauche, em 26 de setembro de 1966. Em um cenário composto pela geração dos baby boomers (os frutos do ‘’boom’’ das taxas de natalidade no pós-guerra), os jovens, excitados, alimentavam o prêt-à-porter. Saint Laurent adorava a idéia de vestir as ruas e não podia experimentar maior euforia com a novidade.

O fotógrafo Helmut Newton clica o ‘’Le Smoking’’ de YSL

Para sempre, Yves Saint Laurent

Com a saúde bastante precária, em janeiro de 2002, Yves Saint Laurent anunciou que estava deixando o mundo da moda. Faleceu de um câncer cerebral, em 2008, mas deixou um legado inegável e comentado até hoje. No dia 24 de abril, estreiou nos cinemas o filme Yves Saint Laurent, do cineasta Jalil Lespert. A produção teve a participação de Pierre Bergé, mas, segundo o diretor, não houve interferências. Lespert procura mostrar todos os lados de Saint Laurent – interpretado por Pierre Niney -, entre altos e baixos. O longa – filmado com figurinos originais – conta por volta de vinte anos da vida do estilista, a partir do momento em que se torna assistente de Dior. Passa por sua relação complicada com Bergé e enfatiza a intensidade do temperamento de Saint Laurent: sua fuga nas drogas e instabilidades emocionais.

Em 1 de outubro, estreia na França Saint Laurent, cinebiografia dirigida por Bertrand Bonello. A produção conta com elenco composto por atores do cinema frânces, com Gaspard Ulliel no papel principal. Já em São Paulo, as homenagens ficam por conta da peça A Feia Lulu, em cartaz no teatro da FAAP. Quem dá vida a Saint Laurent é o estilista Fause Haten. Para compôr a peça, ele se baseou em uma obra de quadrinhos do próprio costureiro, chamada La Villeine Lulu e publicada nos anos 60. A história de uma menininha de 4 anos, que é naturalmente malvada mas que não se deixa incomodar por causa disso, é misturada a trechos da vida de Saint Laurent e do próprio Fause Haten.

Para assistir A Feia Lulu:
Em cartaz de segundas e Terças no Teatro FAAP às 21h, de 15 de abril a 3 de junho
Rua Alagoas, 903 – Higienópolis
Classificação: 14 anos
Para mais informações: www.teatrofaap.showare.com.br

Mais de Yves:

Capa da Vogue francesa, setembro de 1965: o vestido Mondrian da França para o mundo

A primeira jaqueta safari de Saint Laurent, 1968

Vestido shif de ráfia e contas de madeira, African collection, primavera/verão, 1967

Yves Saint Laurent e Karl Lagerfeld, amigos de juventude

Originalmente em: http://www.lado-m.com/yves-saint-laurent-um-genio-imortal/

É tudo novo de novo – A moda de se reinventar

É São Paulo Fashion Week, é Fashion Rio, é muita novidade despencando nas nossas cabeças. Só se fala sobre tendências. “Ai, a cor do momento é o rosa!”, “Mas nos acessórios, o que tá em alta é o étnico!”, “O estilo grunge dos anos 90 voltou com tudo!”. Em meio a tanta coisa, até ficamos perdidos, não é? Mas, veja bem, se pararmos para pensar, o que é esse novo de que tanto falamos? Ele é novo mesmo? Na maioria das vezes, as “novas tendências”, tão divulgadas nas revistas de moda, nos blogs e sites – ou seja, em todos os lugares – são mais revisitações de modas passadas do que algo inédito em si. “Mas, como assim?” Espera, que eu explico.

Uma das principais características da moda é a efemeridade. Se hoje uma coisa está na moda, daqui uma semana, a febre já passou. O que as pessoas usavam para ficar fashion, agora ficou over, e mais rápido do que esperamos: surge uma nova moda! No entanto, só porque tal peça de roupa ou tal estilo já não está mais em evidência, não significa que ele morreu. Não, não mesmo. A qualquer momento, eles podem ressurgir sob a forma de uma inspiração ou de uma releitura. É isso o que faz a moda. O vai-e-vem de estilos, formas e cores, que nascem e renascem a cada nova coleção, às vezes mais fortes, às vezes mais sutis. Eles nos fazem lembrar de tempos que já passaram. “Tá, mas… ainda não entendi!” Quer exemplos? Vamos lá!

Um olhar natural

Mulheres, falemos a verdade. O quanto já não sofremos na hora de fazer as sobrancelhas? Tudo para deixá-las mais fininhas aqui, mais arqueadas ali. Como roupas e sapatos, elas também sofreram mudanças com o passar das décadas. Nos anos 20 e 30, por exemplo, a moda era usá-las finíssimas. Algumas mulheres chegavam até a raspá-las e desenhavam em seu lugar, um traço à lápis. Os traços mais finos eram expressivos e funcionavam como artifício no cinema para caracterizar as personagens: as mocinhas, com sobrancelhas mais curtas, as vilãs, com longas e arqueadas. Depois de engrossarem um pouco nos anos seguintes, essa tendência voltou nos anos 60. Na década de 80, porém, a moda virou totalmente de cabeça para baixo. Chega da sobrancelha fina! A lei era a da naturalidade, e naturalidade implicava em traços mais grossos, volumosos e até em uns pelinhos sobrando aqui e ali! Brooke Shields e Malu Mader foram ícones da época. É essa moda que vem, devagarinho, ganhando seu espaço atualmente. A top model Cara Delevingne e a atriz Lily Collins são os grandes símbolos desse movimento que vem influenciando uma série de mulheres a abandonarem os traços artificiais e a assumirem com propriedade os fios fartos.

A modelo Cara Delevingne e suas sobrancelhas marcantes

A modelo Cara Delevingne e suas sobrancelhas marcantes

E mal cabia na Ana Maria

Que o biquíni é a preferência nacional na hora de ir pra praia, não dá pra negar! Mas não foisempre assim: o conjuntinho demorou para ser aceito. Criado em 1946 por Louis Réard, o biquíni foi um verdadeiro escândalo para a época: para os padrões vigentes, mostrava demais – chegava até a lembrar um pouco os modelos atuais. Foi por isso que, até a década de 50, a ideia foi abortada e foram pouquíssimas eram as mulheres que se renderam à novidade. Foi graças às chamadas pin-ups e à várias atrizes de cinema da época que uma versão mais comportada do biquíni – e mais semelhante aos trajes de até então – foi ficando popular. Essa “nova versão” tinha como principal marca a calcinha de cintura altíssima e pouco cavada. Era quase um shortinho, chegando até a aparecer com uma espécie de sainha sobreposta à peça em si. Foi assim até o final da década de 50. Os preconceitos foram, pouco a pouco, sendo deixados de lado e o biquíni foi dimunindo até chegar no que, para a gente, é super comum. Passou pela tanga, pelo asa-delta, pelo modelo “cortininha”, fio dental e hoje é aceito em todas as suas variações possíveis. No último verão, porém, diversas grifes apostaram num revival dessa moda retrô mais conservadora dos anos 50. As peças apareceram renovadas, com estampas diferentes que davam uma cara moderna ao modelo. A verdade, no entanto, é que não teve jeito. A tendência só se firmou entre as fashionistas e mulherada continuou preferindo o bom e velho biquíninho de sempre.

Cinturinha marcada e modelagem pouco reveladora: era assim o biquíni dos anos 50

Cinturinha marcada e modelagem pouco reveladora: era assim o biquíni dos anos 50

No meio das canelas

Falar de história e de sua relação com a moda é quase implorar para se falar do comprimento das saias. Este aspecto é um dos maiores refletores da busca por independência e da emancipação da mulher. As saias, que sempre foram longas, só começaram a diminuir durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), quando a mulher precisou assumir as máquinas das fábricas enquanto os homens iam para as batalhas. Apesar de subirem um pouco mais nos anos 20 – época que pedia praticidade nas roupas, principalmente para dançar – o comprimento das saias se manteve dos joelhos para baixo até a altura dos tornozelos, oscilando aqui e ali até os anos 60 (quando subiu de vez para o mini). É esse comprimento no meio das canelas, o chamado midi, que vem sacudindo a moda do ano passado para cá. As saias neste modelo vem aparecendo nas mais variadas coleções e de vários jeitos diferentes. Quando mais reta e sequinha, remonta aos vestidos tubulares dos anos 20; quando aparece numa versão godê e mais feminina, faz lembrar o New Look eternizado por Dior no fim da década de 40 e início da de 50. O sucesso do modelo na atualidade, porém, pode ser questionável. Muitas mulheres encontram dificuldades para usar o comprimento – o que faz com que seja amada por umas e abominada por outras.

O clássico New Look, de Dior, e a eternização da saia midí

O clássico New Look, de Dior, e a eternização da saia midí

Let’s Get Physical

Esse ritmo de vai-e-volta das tendências serve pra estilos também. Quando a gente pensa em anos 80, umas das (muitas) coisas que passam na nossa cabeça em relação à moda da época são os modelitos com carinha de academia. Um dos vários estilos que marcaram a década, a onda esportiva veio carregada de peças justas e coloridíssimas. Além disso, não faltaram peças feitas de lycra, como leggings e collants, os agasalhos de moletom – que já davam as caras desde a segunda metade dos anos 70 – e as famosas polainas. Tudo procurando compor looks práticos para o exercício físico, já que falamos de uma época em que o corpo era extremamente cultuado. Moda vai, moda vem, estamos em 2014, e qual é uma das grandes tendências para este ano? Exatamente, o sportswear! Mais ligado a detalhes e releituras, o estilo aparece fazendo as mais diversas combinações: com o college, o urbano, o preppy, e o que mais você quiser. Os tênis, moletons e mochilas aparecem repaginados e mais chiques: dá-lhe estampas, cores, bordados, franjas e tecidos diferentes. Além disso são inúmeras as parceiras de grandes grifes com marcas esportivas como Nike e Adidas.

Para lembrar que a ditadura acabou

As tendências existem e vão continuar a existir. Cada vez mais numerosas, recuperam tempos passados e inovam em seus detalhes. Mas de jeito nenhum podem ser consideradas regras. E isso reflete a grande transformação que a moda vem sofrendo desde o final do século passado.

Quando pensamos nas décadas do século 20, fica fácil caracterizar cada período. Podemos dizer com grandes chances de acerto: ‘’Ah, nos anos 50, se usavam saias rodadas com estampas de bolinha”. Hoje, não é mais assim. A moda vem se tornando cada vez mais diversificada e democrática. Ela tem muito menos a ver com peças ícones e muito mais com personalidade e estilo.

Isso por dois motivos. Primeiramente porque tudo muda com tanta rapidez. Não dá tempo de tal peça atingir o seu auge e ainda manter o sucesso por muito tempo. E segundo porque, são tantas as tendências e novidades que chegam a nós, que fica difícil absorver tudo. Em compensação, essa gama gigantesca de possibilidades nos permite escolher o que melhor nos cai bem e acima de tudo, o que nos faz se sentir bem. O importante é perceber que podemos muito bem acatar às tendências, como ignorá-las ou ainda adaptá-las ao nosso estilo.

Ninguém é obrigado à nada. Muito mais maleável, a moda deixa de ser uma ditadura. Agora, a mulher não só tem liberdade, como tem possibilidade de se aproveitar desse universo como bem entender e o mais importante: sem se sentir oprimida.

Originalmente em: http://www.lado-m.com/e-tudo-novo-de-novo-a-moda-de-se-reinventar/

Zuzu Angel – Ela é a moda e a história do Brasil

‘’Quem é essa mulher/ que canta sempre esse estribilho?/ Só queria embalar meu filho/ que mora na escuridão do mar’’: estes são os primeiros versos de Angélica, composição de Chico Buarque e de Miltinho, do antigo MPB-4. A verdade, porém, é que nem todo mundo sabe quem é essa mulher de quem eles falam: Zuleika Angel Jones, ou simplesmente, Zuzu Angel.

Filha do Brasil

Zuzu nasceu na cidade de Curvelo, em Minas Gerais, em 5 de junho de 1921. Ainda quando pequena, mudou-se para Belo Horizonte, onde logo começou a se arriscar nas máquinas de costura, criando modelos para as primas. Anos mais tarde, já casada com o americano Norman Angel Jones, viveu alguns anos na Bahia. Foram destes dois estados, residências de sua infância e juventude, que Zuzu recebeu as principais influências de sua moda.

Em 1947, Zuzu se mudou com o marido para o Rio de Janeiro e foi lá que começou efetivamente sua carreira como costureira. Sim, era deste modo que Zuzu gostava de se chamar: costureira, mesmo depois de consolidar sua carreira e de abrir uma loja em Ipanema, em 1970. Isso porque não costurava apenas para mulheres da alta sociedade. Precursora do prêt-à-porter no Brasil, ela gostava de costurar para a mulher trabalhadora, que vinha pouco a pouco crescendo no país.

Além disso, Zuzu era defensora inveterada de uma moda verdadeiramente brasileira. A estilista buscou em seu passado os principais elementos de suas criações: temas regionalistas e folclóricos – como a inspiração em Maria Bonita e Lampião -, marcados pelo uso de cores tropicais sempre muito vivas e pelo uso de materiais naturais tipicamente brasileiros, como fragmentos de madeira, conchas, pedrarias e bambu. Além disso, adorava misturar tecidos e ousava em seus modelos, usando chita e rendas regionais – principalmente do Norte e do Nordeste – muitas vezes em vestidos de noiva e de festa.

Uma das características mais marcantes do trabalho de Zuzu, porém, são suas estampas delicadas. Seus vestidos eram – literalmente – pano de fundo para bordados caprichosos de pássaros, borboletas, flores, e de sua marca registrada, o anjo, espécie de etiqueta da marca, que era costurado na parte externa das roupas.

A partir destes elementos, Zuzu criou uma moda bem brasileira, que, fugindo à regra, fez mais sucesso no exterior do que em solo nacional. Enquanto no Brasil seguia-se à risca às tendências americanas e européias, países como os Estados Unidos abriram as portas para a moda tropical de Zuzu Angel. Foi lá que ela realizou uma série de desfiles, chegou a vender seus modelos em lojas de departamento conceituadas, como na Bergdorf Goodman, e ainda conquistou clientes de grande nome, como as atrizes Kim Novak, Joan Crawford e Liza Minelli.

Inspirações regionais: pastoral, franja de seda com bolinhas de jacarandá e renda do Norte, na exposição Ocupação Zuzu Angel

Ela só queria cantar por seu menino

Infelizmente, nem tudo foram flores na vida de Zuzu. Mãe de três filhos – Hildegard Angel, Ana Cristina Angel e Stuart Edgard Angel Jones -, a estilista viu sua vida virar de cabeça para baixo durante a ditadura militar, que tomava conta do Brasil nas décadas de 60 e 70. Seu filho, estudante de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), era também integrante do grupo Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), de resistência armada à ditadura.

Em 1971, Stuart desapareceu e Zuzu saiu à sua procura nas prisões e quartéis do Rio de Janeiro. Mesmo diante de inúmeras negações por parte dos militares, ela se recusou a desistir. Mas foi só quando recebeu uma carta anônima – que depois descobriu-se ser de Alex Polari, ex-guerrilheiro – que Zuzu soube o que realmente havia acontecido. Por ter se recusado a fornecer informações aos militares, Stuart havia sido preso e torturado pelo Centro de Informações da Aeronáutica. Por fim, foi amarrado ao cano de escapamento de um jipe e arrastado pela Base Aérea do Galeão. Stuart morreu afixiado pelos gases tóxicos da fumaça de óleo diesel.

Revoltada e movida por sentimentos de justiça e legitimidade, Zuzu usou de todas as suas forças para reivindicar o corpo do seu Tuti – modo carinhoso como o chamava. Além disso, fez o possível e o impossível para denunciar o crime cometido pelos militares. Escreveu inúmeras cartas e ainda burlou a segurança do Secretário de Estado de Governo dos Estados Unidos, Henry Kissinger, para entregar-lhe um dossiê sobre a morte de seu filho.

No entanto, foi na criação que Zuzu Angel encontrou a sua maior força pra mostrar para o mundo o que de fato acontecia no Brasil. No mesmo ano da morte de seu Stuart, a estilista realizou um ‘’desfile-protesto’’, em Nova York, na casa do cônsul-geral do Brasil nos Estados Unidos. Criou, com muita criatividade, ironia e delicadeza, uma coleção inteirinha de denúncia. Trocou as borboletas e passarinhos por canhões, soldados, tanques de guerra, sóis que nasciam quadrados e anjos amordaçados – todos bordados com traços suaves, lembrando desenhos infantis. Usou a moda a seu favor e criou, assim, ‘’a primeira coleção de moda política da história’’.

Ela ainda passou a usar roupas pretas e acessórios como o icônico colar com pingente de anjo e o cinto com centenas de crucifixos, como forma de tributo à morte de seu filho e ao desaparecimento de seu corpo. Considerada, porém, como uma ameaça, Zuzu passou a ser perseguida e intimidada, o que a levou a escrever uma carta para seu amigo Chico Buarque, na qual avisou que se aparecesse morta, por acidente ou outro meio, teria sido obra dos assassinos de seu amado filho. Zuzu não previa o futuro nem nada: ela apenas sabia com quem estava lidando – o que no entanto, não foi suficiente para que escapasse das mãos dos militares. No dia 14 de abril de 1976, a estilista sofreu um suspeito acidente de carro na saída do túnel Dois Irmãos, na Estrada da Gávea, no Rio de Janeiro – hoje batizado com o seu nome. Em 1998, graças à Comissão dos Desaparecidos Políticos, comprovou-se que Zuzu realmente havia sido mais uma vítima do regime militar.

z8

Zuzu e sua família (© Acervo Instituto Zuzu Angel)

Zuzu não morreu

A ditadura pode ter levado a estilista e seu filho, mas sua história continua de pé. Quase quarenta anos depois de sua morte, a memória de Zuzu continua viva na cultura brasileira. Em 2006, o diretor Sérgio Rezende deu nova vida ao passado de Zuzu Angel e contou no filme homônimo a história da estilista, abrangendo todas as suas facetas. Patrícia Pillar – ao lado de Daniel de Oliveira, como Stuart – incorporou a Zuzu costureira, empreendedora, mãe e mulher de coragem. Em 1977, foi homenageada em um dos carros alegóricos no desfile da escola de samba Império Serrano. Na moda, foi homenageada por vários estilistas, sendo inclusive, inspiração para a coleção Quem matou Zuzu Angel?, de Ronaldo Fraga, em 2001.

Uma das influências mais importantes do passado da estilista é o Instituto Zuzu Angel (IZA), idealizado e fundado em 1993 por sua filha, Hildegard. O IZA é uma entidade sem fins lucrativos, que além de funcionar como acervo da estilista, tem como objetivo preservar a memória de Zuzu e investir em jovens talentos da moda brasileira. Além disso, são inúmeros os projetos que homenageiam a costureira, entre eles a Casa Zuzu Angel de Memória da Moda do Brasil, museu de moda fruto da parceria do IZA com o governo do estado do Rio de Janeiro.

O museu de moda – que reunirá peças de Zuzu e de outros estilistas – deve ser inaugurado apenas em outubro, mas, enquanto isso, os fãs da costureira podem conhecer sua história mais de perto na exposição Ocupação Zuzu, em cartaz de 1º de abril a 11 de maio, no Itaú Cultural de São Paulo. A retrospectiva reúne mais de 400 peças, entre vestidos, bordados, croquis, cartas, fotografias e documentos. Tem curadoria da filha da estilista, Hildegard, junto com equipe do Itaú Cultural e Valdy Lopes Jn, e procura mostrar os vários lados de Zuzu. A exposição conta com um lounge com uma linha do tempo contando a história de Zuzu e mais três andares, trazendo ainda fotos e objetos inéditos de Stuart, além trechos de vídeo do desfile-protesto. O evento antecede a volta da grife ao mercado, que voltará a ser vendida a partir de setembro. A equipe de estilo será provavelmente composta por designers formados pelo Instituto Zuzu Angel e poderá ser liderada pela estilista Alice Tapajós, parceira da instituição.

Em 2014, o Golpe Militar faz 50 anos. 38, desde a morte de Zuzu Angel. Tempo – ou governo – nenhum, porém, apaga a luta e o talento desta mulher, que revolucionou a moda brasileira e se consagrou com um exemplo vivo de luta e coragem.

Símbolo da marca, o anjo era estampado na parte externa das camisetas, uma inovação para a época

Ocupação Zuzu
Em cartaz de 1º abril a 11 de maio, no Itaú Cultural, Avenida Paulista, 149, Estação Brigadeiro do Metrô
De terça a sexta, das 9h às 20h
Sábado, domingos e feriados, das 11h às 20h
Itaú Cultural: (11) 2168-1776/ (11) 2168 – 1777
www.itaucultural.org.br
www.twitter.com/itaucultural
www.facebook.com/itaucultural
www.youtube.com/itaucultural
www.flickr.com/itaucultural

Veja mais fotos da exposição:

As misturas de Zuzu, o chique e o comum: vestido de organza de seda pura com renda de algodão tingida

“Los Angeles – Califórnia”, modelo para a coleção Miss Bergdorf Goodman

Originalmente em: http://www.lado-m.com/zuzu-angel-ela-e-a-moda-e-a-historia-do-brasil/

A fotografia de Nair Benedicto

Em 2014, Nair Benedicto completa 74 anos. Já é uma senhorinha, é verdade, mas nem por isso deixa de fazer o que sempre lhe deu prazer: fotografar. Prazer este que, no entanto, surgiu de um modo um tanto inusitado.

Paulista, Nair sempre gostou muito de trabalhar com imagens. Com o objetivo de ingressar na televisão, entrou no curso de Rádio e TV da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP. Foi lá que, influenciada pelo movimento estudantil, Nair transformou um pré-existente sentimento de mudança em algo muito mais vivo. Ela se envolveu principalmente na área da comunicação, tanto na luta por melhorias em seu curso quanto em discussões sobre o momento que se vivia no Brasil naquela época, em plena a ditadura militar.

Nair, em ação

Nair era casada, mãe de três filhos e não tinha nenhum envolvimento com grupos armados de luta contra o governo. Mesmo assim, a estudante não escapou da mão dos militares. Em 1969, foi presa e levada para o DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), no centro de São Paulo, onde também foi torturada. Depois, foi transferida para o já extinto Presídio Tiradentes, onde chegou a dividir cela com a atual presidenta Dilma Rousseff. Ao todo, Nair ficou presa por nove meses, sendo que nos dois primeiros, esteve totalmente incomunicável.

Após ser libertada em 1970, porém, Nair viu seu sonho de trabalhar na televisão ruir. Ingressar em emissoras era algo muito complicado pois todas exigiam – mesmo sendo ilegal – uma espécie de ‘’atestado de boa conduta’’ e sua passagem pela prisão não era algo que colaborava muito. Foi aí que Nair viu na fotografia uma alternativa. Um jeito de trabalhar com a imagem e ainda fazer isso de modo independente.

Assim, logo depois de se formar, em 1972, ela começou sua carreira como fotógrafa, trabalhando inicialmente na empresa Alfa Comunicações. Sete anos depois, junto de Ricardo Malta e dos irmãos Juca e Delfim Martins, Nair fundou a Agência F4 de Fotojornalismo, a partir da qual buscou autonomia perante os jornais e revistas, e exerceu um grande papel na luta por direitos autorais e trabalhistas para os fotógrafos.

Foi nesta mesma época que Nair fotografou várias das manifestações populares que vinham ocorrendo no Brasil e que caracterizaram os últimos anos da ditadura militar. Ela foi uma das primeiras mulheres a cobrir eventos como estes – tarefa que, até então, só era realizada por homens. Fotografou inclusive uma série de movimentos sindicais, o que deu origem a materiais que serviram para a elaboração de um de seus livros, chamado A Greve do ABC (1980).

Apesar de ter sofrido os terrores da ditadura, Nair não usou a fotografia como arma de vingança. Ela procurou usar seus talentos para fazer o que sempre desejou: defender causas de cunho social e evidenciar a necessidade de mudanças. Foi até a Amazônia e fotografou uma série de tribos indígenas: Kayapós, Araras, Tembé, Kaxinawá.  Ela tinha o objetivo de revelar como era a realidade destas pessoas e como os grandes projetos “do homem branco’’ – como a usina de Tucurui – interferiam em suas vidas.

Índio Arantx, Manouki do Mato Grosso, 2006 (Nair Benedicto)

Com sua câmera, também procurou captar os problemas dos trabalhadores sem terras, a identidade dos nordestinos que vinham para São Paulo em busca de uma vida melhor, e a posição da mulher brasileira na sociedade – tema que a encantava. Nair se dedicou tanto a este tema que, durante 1988 e 1989, ela foi nomeada delegada pela Unicef para realizar uma documentação sobre a situação da mulher e da criança na América Latina.

Em 1991, a fotógrafa se desligou da Agência F4 e fundou a N-Imagens, a qual dirige até hoje. No mesmo ano, ao lado de grandes fotógrafos como Stefania Bril, Marcos Santilli, Rubens Fernandes Júnior e Fausto Chermont, ela integrou a equipe criadora do Núcleo dos Amigos da Fotografia (NAFoto), que durou vinte anos e foi responsável pela realização dos eventos bienais intitulados Mês Internacional da Fotografia de São Paulo.

Apesar de ter fotografado essencialmente a realidade brasileira, o trabalho de Nair é reconhecido no mundo todo. Suas fotos já foram publicadas em uma série de jornais e revistas nacionais e internacionais, tais como Veja, IstoÉ, Marie Claire, Ícaro, Paris Match, BBC Ilustré, Newsweek, Time, entre muitos outros. Além disso, tem ensaios expostos em alguns dos mais importantes museus do mundo: na Coleção Pirelli, do MASP, no Museu de Arte Moderna no Rio de Janeiro, no Smithsonian, em Washington e no MoMa, em Nova York.

Travestis no Rio de Janeiro, 1984 (Nair Benedicto)

É no MoMa que está exposto o primeiro trabalho independente de Nair. Curiosa por descobrir quem era e o que faziam os nordestinos que deixaram suas terras e vieram para São Paulo, Nair acabou no Forró do Mário Zan, no Jabaquara, bairro de São Paulo. Lá, fotografou a felicidade, a paixão e a cumplicidade daqueles que dançavam. No mesmo local, ela montou uma exposição de suas fotografias, a qual chamou a atenção de John Szarkowsky, diretor do MoMa, que estava em São Paulo. Ele adorou o ensaio e o comprou na hora.

Reconhecidíssima, Nair também já recebeu uma série de prêmios – entre eles o 11º Prêmio Abril de Fotojornalismo e o Prêmio Embratur, e elaborou vários livros. Além de A Greve do ABC, reuniu ensaios em A Questão do Menor (1980), Nair Benedicto: As Melhores Fotos (1988) e no recente Vi Ver (2012), que faz um panorama de sua trajetória como fotógrafa. O livro é dividido em duas partes: Amazonias, que apresenta a região sob um viés humanitário, e Desenredos, onde traça retratos sociais e culturais resumindo suas quatro décadas de trabalho com a fotografia. Nair montou este livro com uma série de fotos que eram inéditas até então. Para ela, estas imagens precisavam ser mostradas, pois, além de terem seu papel social, contavam parte da história do Brasil.

Tesão no Forró no Mário Zan, 1977 (Nair Benedicto)

A verdade é que Nair é um grande exemplo. Ela acredita que a fotografia tem um papel transformador e uma força de expressão muito grandes, e se aproveita disso para chamar a atenção das pessoas para questões sociais que considera relevantes. Utiliza seu trabalho como linguagem para contar histórias, revela universos desconhecidos e emociona. É o seu jeito de mudar, pelo menos um pouquinho, o que precisa ser mudado.

Originalmente em: http://www.lado-m.com/a-fotografia-de-nair-benedicto/

Karen Kasmauski, a contadora de histórias

“Uma contadora de histórias com uma câmera”: é assim que Karen Kasmauski se define. Fotógrafa, Karen rodou o mundo e viu muito mais do que se pode imaginar. Do Alaska ao Japão, aponta sua câmera procurando captar realidades, por vezes, ignoradas, e que nem por isso deixam de existir.

Karen Kasmauski entrou na faculdade com o objetivo de se tornar bióloga marinha. Seus planos, no entanto, não deram muito certo. A fotógrafa se formou em Master Of Arts, na Universidade de Ohio, e em antropologia e religião na Universidade de Michigan, o que a ajudou a explorar em seus trabalhos uma de suas maiores fascinações: a ciência. Procurando traduzir o modo como a ciência afetou e pode transformar o destino do mundo, seus ensaios fotográficos buscam retratar as consequências do avanço econômico e tecnológico na sociedade e no meio ambiente.

A fotógrafa Karen Kasmauski

Karen Kasmauski começou sua carreira como fotógrafa assistente no Ledger-Star, versão vespertina do jornal The Virginian-Pilot. No entanto, desde 1984, Karen fotografa para a revista National Geographic, já tendo realizado 25 grandes reportagens. Quase sempre, os ensaios partem de ideias da própria fotógrafa, e a moça não se poupa de aventuras. Foi até o congelante Alaska para ver como se dava a extração do petróleo e captar o seu impacto no meio ambiente e no dia-a-dia dos habitantes. Na Rússia, se expôs à radiação procurando mostrar justamente os efeitos desta na vida das pessoas. Em outro ensaio, chegou a visitar regiões próximas a vulcões na Guatemala e na Nicarágua, procurando registrar não apenas a cultura do povo que vive nestas área como os efeitos das cinzas vulcânicas no cotidiano dos habitantes.

Além disso, ela tem focado também em matérias sobre saúde, abordando temas como a obesidade na sociedade norte-americana, a busca pela cura da AIDs e o mal de Alzheimer. De origens japonesas – ela nasceu na base naval americana no Japão -, Karen Kasmauski também explora suas raízes em vários de seus trabalhos. Realizou um ensaio retratando a mulher japonesa, por exemplo, e em outro ensaio procurou destacar o papel econômico do Japão dentro da Ásia.

W. Maxwell Lawton, artista e portator de AIDS aplica em si mesmo uma injeção semanal de testosterona. Lawton viveu mais de 10 anos do que os médicos previram

Além de fotografar, Karen usa sua experiência para ensinar. Ela dá uma série de palestras sobre questões globais e é professora em várias escolas e faculdades, entre elas a George Washington University. Tem também uma relação muito próxima com organizações não-governamentais (as ONGs) e com a Nikon, sendo um dos membros prestigiosos do grupo Legends Behind The Lens.

E se não bastasse tudo isso, Karen Kasmauski transfere o seu trabalho para os livros. Impact: From The Frontlines of Global Health, obra sobre a carreira da fotógrafa na cobertura de assuntos relacionados à saúde, foi indicado ao estimado prêmio Pulitzer de jornalismo, literatura e música. Ela elaborou Impact com o objetivo de enfatizar que mudanças geográficas tem uma repercussão muito grande na vida das pessoas. A maioria destas mudanças, em inúmeros casos provocadas pelo próprio homem, muitas vezes terminam em condições de vida pouco saudáveis, o que aumenta o risco de uma série de doenças. Mais recentemente, em parceria com a Emore University, Karen desenvolveu o livro Nurse: A World of Care, que revela as questões que envolvem o trabalho de enfermagem mundo afora.

Os banheiros externos, construídos em regiões pouco desenvolvidas, como na Índia e em Bangladesh, é uma das maiores fontes de doenças por contaminação da água

Pensando sempre nas pessoas, sua maior preocupação é aliviar o sofrimento das pessoas e chamar atenção para os problemas globais através de suas histórias. Karen Kasmauski não é ambiciosa e sabe que fotos por si só não vão mudar o mundo. Mas espera que, através de seu trabalho, possa mostrar para o mundo realidades que as pessoas não sabem que existem, mas que precisam saber.

Veja mais fotos de Karen:

Em 1995, Karen foi até Kobe, no Japão, cobrir os efeitos do Great Hanshin Earthquake, terremoto de 7.2 pontos de magnitude

Mulher preparando uma refeição próximo a um criadouro de porcos, na China. Cientista acreditam que viver próximo de porcos e patos, nestas condições, facilita o cenário para espalhar e contrair o vírus da gripe aviária

Sobrevivente da varíola, na Nigéria. A varíola é uma doença que pode causar úlceras na córnea, que por sua vez, podem levar à cegueira

Originalmente em: http://www.lado-m.com/karen-kasmauski-a-contadora-de-historias/

Blues: Melancolia que faz música

Imagine o seguinte cenário: Estados Unidos, os navios negreiros aportavam, e deles desciam milhares de negros vindos da África para trabalhar nas plantações de algodão dos estados do sul. Imaginou? Pois bem. Foi daí que nasceu o blues, estilo musical que marcou e foi marcado pela história.

Dos navios negreiros, junto com os negros, desciam também elementos de uma cultura completamente diferente da americana, com outros valores, crenças e modos de expressão. Um desses modos eram os chamados hollers, expressão vocálica que se assemelhava a gritos. Foi a partir destes sons que, no ambiente monótono de trabalho, surgiram as work-songs, canções cadenciadas no ritmo das tarefas repetitivas realizadas pelos escravos.

Muitas vezes impedidos de utilizarem instrumentos, os negros tinham na voz seu principal modo de expressão. Foi assim que as work-songs migraram das plantações para a vida cotidiana dos escravos e suas famílias, dando origem, pouco a pouco, ao que chamamos de blues. Son House, um dos primeiros grandes bluesman, soube traduzir a origem do blues de modo bastante objetivo. ”As pessoas insistem em me perguntar onde os blues começaram e tudo o que eu posso dizer é que, quando eu era garoto, a gente estava sempre cantando nos campos. Não chegava a ser canto, era mais gritaria, mas nós fazíamos nossas canções sobre as coisas que estavam acontecendo com a gente na época e acho que foi assim que o blues começou”.

Foto de Son House

Nascido no Mississipi, Son House foi um dos pioneiros do blues

A voz, quase sempre acompanhada de violão ou gaita-de-boca, cantava sobre a vida sofrida dos negros em uma sociedade racista. Essa melancolia remete ao significado do nome blues, que, em suas muitas definições, carrega sempre uma carga negativa, relacionando-se à tristeza. Por meio da música, os negros falavam sobre tudo: o trabalho nas plantações; bebidas; doenças comuns na época, como a tuberculose; acontecimentos da história dos Estados Unidos; e, principalmente, amor e sexo.

Afirmar com exatidão quando surgiu o primeiro blues é algo muito difícil. No entanto, o nome mais citado quando se fala em pioneiros é, sem dúvida, o de W.C. Handy, que chegou a se autointitular o ”pai do blues”. Handy entrou para a história com o primeiro de todos os blues, The Memphis Blues, de 1912. No entanto, foi St. Louis Blues, composto logo em seguida, que se tornou o mais famoso de todos os tempos.

Apesar de ter se desenvolvido em vários estados da região sul dos Estados Unidos, o verdadeiro berço do blues se localiza no delta do rio Yazoo – e não no delta do rio Mississipi, próximo à Nova Orleans, que é, na verdade, o berço do jazz. O delta trouxe fertilidade para as terras de plantação de algodão, o que, de um modo indireto, favoreceu o desenvolvimento de grandes bluesmen, como Charley Patton, “o pai do delta blues”, e Son House.

Porém, foi Robert Johnson quem, de longe, mais se destacou nesta época. Sua música se encaixava no estilo de blues rural, lento e melancólico. No entanto, sua obra transcendia os limites do rótulo. Cresceu vendo seus ídolos tocarem nas jook joints (espécie de boate frequentada pelos negros) e, apesar de pouco reconhecido em vida, ganhou notoriedade ao longo da tempo.

Sua busca pelo sucesso, porém, deu origem a uma das lendas mais misteriosas da história do blues: em troca da genialidade musical e do consequente reconhecimento, Johnson teria vendido sua alma para o diabo. Mito ou não, depois do famoso pacto, o cantor teria realmente começado a conquistar o sucesso. A lenda foi até retratada no filme A Encruzilhada (Crossroads), de 1986. Gravou apenas 29 blues, mas é considerado um ícone. Tornou-se muito famoso nos anos 60, influenciando diretamente uma série de músicos britânicos da época. Seus hits mais famosos são Crossroads, Sweet Home Chicago e Love In Vain.

Foto de Robert Johnson

Robert Johnson, o mais misterioso de todos os bluesman

Na década de 30, porém, o blues ganhou novos rumos. Com a crise econômica, a praga do algodão, o desenvolvimento dos meios de transporte, entre outros fatores, a população negra dos estados do sul começou a migrar para as cidades. E, se para o blues rural estava Mississipi, para o blues urbano estava a grande Chicago. Este cenário de mudança, combinado com a explosão tecnológica, provocou o desenvolvimento do blues em um ritmo cada vez mais intenso e promissor nas grandes metrópoles. Pouco a pouco a guitarra elétrica foi introduzida e a música perdeu um pouco de seu ritmo lento.

O maior expoente desta geração foi Muddy Waters. O bluesman, famoso por hits como Hoochie Coochie Man e Just Make Love To Me, foi um dos que melhor assimilou o uso da guitarra elétrica nesta nova geração do blues. É por este motivo que a música de Waters é uma das influências mais vivas no rock n’ roll dos anos 60. Um exemplo mais do que claro é o nome da banda Rolling Stones, tirado diretamente do título de uma de suas músicas. Junto com Waters, também fizeram parte desta fase Howlin’ Wolf, John Lee Hooker e Lightnin’ Hopkins.

Foi nesta época que o chamado ”rei do blues” começou a despontar. B.B. King, que aprendeu a tocar violão com o pastor da igreja, trocou o trabalho nas lavouras por apresentações nas esquinas da cidade de Indianola. Em 1949, gravou seu primeiro disco, e não parou mais. Com sua guitarra, batizada de Lucille, chegou a fazer 300 shows por ano. Seus maiores sucessos são Three O’Clock Blues, Sweet Sixteen e The Thrill Is Gone. B.B. King grava discos até hoje e é um dos últimos mestres do blues que continua vivo.

Foto de B.B. King

B.B. King e sua guitarra, Lucille

Mas não era só de homens que o blues era feito. Por viverem em uma época em que não tinham muitos direitos, as mulheres conquistaram um lugar de destaque na história da música. A grande pioneira foi Ma Rainey. Chamada de ”a mãe do blues”, foi a primeira mulher negra a gravar um disco. Influenciou diretamente sua sucessora, a durona Bessie Smith. Bessie começou a cantar com apenas nove anos e conseguiu equilibrar em sua música aquilo que o blues tinha de primitivo e de moderno. Se Ma era a ”mãe”, Bessie era a ”Imperatriz”. Independente, foi a primeira grande vendedora de discos, chegando a salvar a gravadora Columbia Records da falência. Foi aberto então o caminho para as mulheres, e não apenas as negras. Janis Joplin, a branca de voz forte e rouca (como as das poderosas cantoras negras), teve uma carreira curta, porém meteórica.

O tempo passou, mas o blues não está nem perto de seu fim. Dos anos 60 para cá, influenciou dezenas de artistas, entre os quais grupos como Rolling Stones, The Animals, Cream, Led Zepellin, Eric Clapton, Stevie Ray Vaughn e até o lendário Jimi Hendrix. Hoje, o blues continua vivo através de nomes como Robert Cray, Jonny Lang, Kenny Wanye Shepard e Joe Bonamassa. Mesmo que, atualmente, não faça tanto sucesso como em seus anos dourados, o blues ainda inspira novos artistas e mantém o seu público fiel.

Originalmente em: http://www.lado-m.com/blues-melancolia-que-faz-musica/